O ciclo da Lunação em que estamos começou no momento em que a Lua encontrou o Sol em Sagitário e simplesmente desfilou bem no nariz dele, como os gatos fazem quando estamos em vídeo aula, eclipsando a câmera.
De lá pra cá a bichinha passou por bastante coisa! Enfrentou os dois maléficos ao mesmo tempo, abriu alas para Saturno entrar em Aquário, onde ela fez sextil com quase todo o pessoal, depois quadrou o Mercúrio no coração do Sol. Se atrasou mas viu um finalzinho do encontro dos grandes Júpiter e Saturno, apanhou de Marte quando passou por Áries, se recuperou durante o feriado de Natal, no sítio do Touro, fez seu primeiro trígono com os grandes (um tanto mais arejados agora em Áquário) e nesse caminho todo cada vez se enchendo mais brilhante, pois à medida em que se afasta do Sol ela consegue refletir mais de sua luz. Na noite de hoje, um pouco depois da meia noite (0.29h do dia 30 de dezembro) ela chega no máximo da distância em relação ao Sol e assim bem de frente a ele toda a face visível do corpo fica iluminada por ele. A Lua cheia será no grau 9 do signo do caranguejo, ela ainda tem o dia todo para se preparar. Assim quase cheiona ela chegou em casa às 8.14h da manhã. Em casa pois é ali no signo de Câncer que a Lua larga o sapato logo na porta de entrada, joga bolsa e casaco na primeira poltrona e corre pra se refrescar e vestir um robe de chambre.
♫ Call me unpredictable, tell me I'm impractical
Rainbows, I'm inclined to pursue ♪
Ela sai do banho já pensando na comida. Abre a geladeira. A geladeira é a coisa mais enorme e linda! É como se fosse aço escovado mas num matiz amarelado. Na verdade é muito próximo de um perolado. Interessantíssimo móvel lunar.
Por ora ela só se serve de um pedaço de bolo de chocolate e pega um livro da prateleira. Não deu pra ver qual livro; ela apoiou sobre a capa o pratinho de bolo fazendo-o de bandeja enquanto se serve de uma taça de vinho tinto, bem pegado, pra flertar com o Sol em Capricórnio que ela pode ver pela janela, logo do outro lado da rua.
Se atira numa poltrona. Já que comecei a falar da decoração, poltronas não faltam nessa casa, dos mais diversos modelos e épocas, a impressão que dá é que a Lua até adota poltronas das pessoas. Ai se minha poltrona falasse. A verdade é que fala. Todos temos no mapa uma Lua que fala com poltronas, pode procurar.
Enfim ela coloca o livro na mesinha e podemos ler o título: HOW TO BE A DOMESTIC GODDESS, da Nigella Lawson.
O livro já bem ilustrado pelo uso constante. Digo ilustrado porque assim são alguns livros de receita quando eles ficam ali na bancada e recebem uns respingos do processo, um dedo sujo de cúrcuma que toca uma página e essa ação fica visivelmente marcada na memória do papel.
A Lua sabe que esse é só um pequeno descanso, e nem precisa de muito mais. Não precisa comer na cama direto da panela apesar de tentador. Lembremos que essa cheia vem de uma Lua Nova em Sagitário, o signo mutável de fogo. Além disso a Vênus, que fala das gostosuras, não só não faz aspecto com a Lua, nossos corpos, notem que essa será a única menção a Vênus nesse texto. Na passagem do réveillon (mais um mapa notável dentro do ciclo de lunação em Sagitário) a Lua estará em Leão, aí sim participando de um triângulo com Vênus em Sagitário e com Marte em Áries. Deusa sim, mas sem tempo pra indolência. Assim é o fogo.
Menu da Lua Cheia
Foi a Lua nova em Sagitário para Lua cheia em Câncer e que traz portanto o fogo da mudança, a busca jupiteriana pela verdade e pela concórdia.
“Mas algumas vezes não queremos nos sentir como uma mulher pós-moderna, pós-feminista e sobrecarregada, mas sim uma deusa doméstica, deixando um rastro de fumaça de noz-moscada de torta assando.
Portanto, não estou falando exatamente de ser uma deusa doméstica, mas de me sentir como uma. Uma das razões pelas quais fazer bolos é satisfatório é que o esforço exigido é muito menor do que a gratidão concedida. Todos parecem pensar que é difícil fazer um bolo (e não há necessidade de desiludi-los), mas não leva mais de 25 minutos para fazer e assar uma bandeja de muffins ou um bolo de esponja, e o retorno é alto: você depois disso, sinta-se desproporcionalmente bem consigo mesma.”
Poderiam perfeitamente serem palavras da da Lua sagita-canceriana, mas são da própria Nigella.
E nem é só bolo que dá esse truque bom! Batata assada apresenta ainda melhor relação custo-benefício e muita gratidão concedida. O custo maior é tempo, porque demora mesmo. Então a Lua já se levanta, coloca o forno para esquentar, lava umas batatas, faz uns furinhos na casca e coloca as batatas no quentinho. “Elas bem que se parecem comigo” olha estranhamente as pequenas luas iluminadas pela lâmpada do forno ‘há até a face escura’.
Como a Lua acabou se vendo nas batatas fico felicíssima por ela ter se lembrado de fazer os furinhos na casca. Marte está em Áries e quadra a Lua em Câncer. Marte faz o sangue ferver, assim como o calor do forno faz ferver a água interna dos alimentos, e o vapor precisa de espaço pra se expandir. Sem os furinhos para que esse vapor saia em paz a pressão ali dentro aumenta, aumenta até que BUM!
Imagina o trauma se a Lua vê seus retratos tridimensionais explodidos salpicando as paredes do forno! Por favor, furinhos na casca e na vida, gente!
Dá tempo de tomar mais uma taça na varanda. Realmente, quanta coisa desde a Lua nova! Ela se lembra de ter visto, quando passou por Gêmeos, Júpiter e Saturno já tão diferentes! Eles estavam com uma baita águia, nem pareciam aqueles velhos pesados de tão pouco tempo atrás. Mas ela ainda sente esse peso. Estamos mesmo tão ligados a alguns pontos do Tempo. O início da Lunação é um desses pontos. A gente lia Dom Quixote quando teve início o ciclo em que estamos agora. O Sol de hoje, conjunto à estrela fixa Facies, a estrela da ponta da flecha do Sagitário, afirma que o ideal cavalheiresco continua nos guiando apesar do eclipse.
Da sua varanda ela vê Marte domiciliado ocupadíssimo, vê Sol e Mercúrio também ocupadíssimos na casa de Saturno. Um colérico, os dois melancólicos, ela fleumática. Todos bem íntegros apesar dos aspectos duros.
A refeição vai fazer a mistura entre eles: já secamos a Lua batata no forno, sem pressa, por oposição; vamos fazer a quase a mesma coisa com uma Lua cebola mas por quadratura de Marte: uma faca corta a cebola em minguantes, a temperatura do forno aumenta e ela fica com as pontinhas tostadas. A Lua acolherá isso tudo, e ainda vai umedecer esses cabras: a cebola vai ganhar aceto balsâmico, porque o tempo também cura, e vai se deitar em uma cama de manjericão. Bastante manjericão. A batata será servida com vagem na manteiga, um preparo que lembra aquele clássico que era comumente servido em travessinhas ovais há algumas décadas. Só que molengas do cozimento excessivo e nadando em uma piscina de margarina. O Sol caprica se lembra disso, tenho certeza! Happy hour no Bar Palácio, chopinho, cigarro, tira gôsto, ervilha na manteiga. Aqui a gente vai mudar alguma coisa: a vagem seguirá crocante e na manteiga a gente vai dar uma tostadinha em uns filetes de casca de limão, de pimenta do reino quebrada na hora e assim todos os preparos ficam misturadinhos. Azedo, queimadinho, confortativo. E vagem, que é um ninho de feijão.
Para dar um peso a gente abre o armário e pega os que não estão à vista mas dão o tom, inclusive um deles é exaltado e outro dá domicílio aos luminares: Júpiter e Saturno, figo seco e azeitonas pretas, mais ingredientes clássicos de conservação como vinagre, açúcar e álcool, que vão resultar num chutney interessante que mostra bem o que se associa muito bem ao signo fixo sanguíneo.
E bolo de chocolate suntuoso, que pode ser entrada e pode ser sobremesa.
Planetas em Capricórnio advertem: sirva com chá verde.
É bem doce. Mas como disse a Nigella: “Se você quer um bolo sugar free então não coma bolo.”
Para o preparo, podemos começar pelo fim e aproveitamos o forno quente do bolo para assar as batatas junto. Então fure umas batatas não muito grandes e deixe ali do ladinho, fora do forno. E coloque o forno para esquentar a 180°C.
Vídeo: Dark and sumptuous chocolate cake recipe - Simply Nigella: Episode 2 - BBC Two
225g de farinha de trigo
1 ½ cc bicarbonato de sódio
½ cc sal
1 ½ cc café solúvel
15g de cacau em pó
300g açúcar mascavo
375ml água quente
90ml / 75g óleo de coco
1 ½ cc vinagre de maçã ou de vinho branco
Cobertura:
15g óleo de coco
50g açúcar mascavo
1 ½ cc café solúvel
1 ½ cc cacau em pó
150g chocolate em barra 70% cacau, picado
Ferva os quatro primeiros ingredientes. Apague o fogo, junte o chocolate picado, dê um minuto para que ele derreta e com um fouet ou um garfo misture bem para que fique lisinho. Reserve.
Para o bolo. Forno aquecido, forma untada. É sempre assim que se começa um bolo. O preparo também segue um clássico: misture os secos, misture os líquidos (e o que precisa ser derretido ali), misture os dois:
Misture em uma tigela grande a farinha, bicarbonato, sal, café e cacau. Reserve.
~ acomode as batatas nos caninhos do forno ~
Em outro recipiente misture a água quente e a gordura de coco, deixe derreter. Adicione o açúcar, que também deve se misturar bem e o vinagre. Junte isso à tigela de ingredientes secos. Coloque na forma e leve ao forno. A Nigella diz 35 minutos, o meu demorou o dobro. Fica de olho aí.
Se você esqueceu de colocar as batatas, deixe para depois. Não abra essa porta!
O chutney pode ficar guardado na geladeira então pode ser feito na véspera se for mais cômodo.
Eu prefiro comprar as azeitonas com caroço porque as azeitonas que encontramos no supermercado já são tão sem gosto, sem caroço então, tenho a impressão que fica totalmente lavada pela salmoura. Quem conseguir comprar uma conserva em óleo em um mercado municipal por exemplo, terá muito mais sorte. Pra quem não consegue, sugiro que façamos o seguinte: comprar 400g de azeitonas com caroço, desencaroçar e pesar de novo só a polpa.
325g de figo seco, cortado em quatro
220g azeitonas pretas sem caroço (eu colocarei muito mais no próximo)
100g de açúcar mascavo
1cc sementes de funcho (se você só tiver erva doce, use erva doce)
1cc canela
Uma pitada de cravo em pó
60 ml vinho Marsala (eu usei uísque)
150ml de vinagre de vinho tinto
100ml de água
Exceto a azeitona, cozinhe tudo por 15 minutos. Cuide para que não fique muito seco. Apenas no final juntes a azeitonas. Deixe esfriar e processe.
500g de cebolas roxas pequenas ou a cebola do tamanho e cor que você tiver
70 ml azeite de oliva
½ cc sementes de funcho ou erva doce
½ cc sal 1cc aceto balsâmico
50g manjericão fresco (um macinho)
Corte as cebolas; se forem pequenas corte em quatro.
Se grandes em 8. Besunte-as com o azeite e funcho.
Leve ao forno aquecido a 200°C. Quando a cebola estiver assada e suas bordinhas tostadas, retire do forno, adicione o aceto com o sal e deixe esfriar.
Na hora de servir junte o manjericão.
500g vagem holandesa ou da nossa tradicional
40g manteiga vegetal
½ cc azeite de oliva
1 limão tahiti
Sal
Pimenta do reino preta
Coloque para ferver uma panela com bastante água salgada.
Limpe a vagem: corte as pontinhas e se puxando sair o fiozinho lateral, retire-o também.
Retire do limão 4 fatias de casca, sem a parte branca, e esprema o suco de metade dele.
Quebre a pimenta do reino.
Quando a água ferver cozinhe a vagem inteira. A vagem holandesa leva 7 minutos. A nossa tradicional é mais larga, deixe 8 ou 9 se não estiver bem novinha. A melhor maneira de decidir é experimentando.
Escorra a vagem e reserve.
Na mesma panela já quente, coloque o azeite de oliva e derreta a manteiga. Adicione as cascas de limão e a pimenta do reino.
Corte as vagens em 3 ou 4 pedaços de uns 4cm, do tamanho de bocados.
Adicione o suco de limão à panela, mexa e junte as vagens. Verifique o sal.
Sirva com as batatas assadas.
[texto enviado na data da lunação para apoiadores, publicado aqui em 28/02/25]
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